terça-feira, 1 de março de 2011

POEMA CAMPESINO

       Eulália M. Radtke
                 
                           Ed. Cadernos Literários-Tribuna de São José 


A rosa-dos-ventos
é vermelha e amarela
é terra em verde-luz
            q’ilumina o fogo
            d’um tempo d’abraço terno
            na pele se estendendo.

Quando em lombos de mulas lentas
galopavam as primaveras espalhadas
            pelos jardins,
no rumo dos girassóis transbordavam
açúcar/néctar e cheiros
pelos beiras dos rios lentos
-ai beija-flores,ai abelhinhas, ai beijo da natureza
  tanto canto de Deus.

Que castelos de tons trovados
nas tardes observadas do Comendador.
Que maios ou setembros
                      nos espinhos da Roseira.
Que janeiros ou dezembros
                      entre os quatros pontos cardeais.

Dá roseiras em campo largo,
canarinhos amarelinhos cantador
                                     de telhados,
vinho forte
feijão de todo dia
paçoca de pilão socada.
Em campos largos da roseira
                               e da espinho,
erva-mate, saracura
marreco-d’água,carqueja
bracatinga com flor de mel
cedros verdes e cavalos voadores
                           d’Haras Fortaleza
                           d’Haras de Araras
                           d’Haras do sonho maior.

Na prosa do Comendador
moravam as distâncias das terras
-os alicerces do poder-
( a construção do campo-santo)
             Rio Cotia
             Rio Despique
mulas sonolentas garimpando
a lida,
milhares de asas de pássaros
pousavam na cor do tempo
quando a palavra clara
                             queimava no coração
num passo triste d’um rio demorado,
para dançar mais adiante
nos braços da saudade
                    d’uma festa de São João.

                    Floresce ainda
                    onde os pássaros inda abrem vôo
                             no verde curvo dos campos,
os rastros de grama unida
q’junto dos cavalos ligeiros vão
ornar jardins longínquos,suntuosos
a preços de patacos altos.
Florescem as pinhas florescem as cavas.
Florescem os lagos com sementes nativas:
traíras,caras,piavas, ainda.
Florescem ainda e sempre as esperanças
                  -a roupagem dos sonhos
                    a sinopse da vida.

-II-

Nas mãos da História agitam
                            o silêncio.
E no fluxo e refluxo de tudo
ainda sobra seo Antônio Machado
guarda um brilho das águas
                            que viveu , no refúgio
das lembranças aquietadas
no culto do peito,
onde a memória surge e ressurge
         e se esconde
         porque são 92 anos
desde que soltou seu primeiro grito
         nos estirões de Campo Largo,
onde verteu os instantes
que jamais serão iguais.

Quem vai contar
                 Campo Largo?
-as parteiras plantadoras de vidas?
         (as Emílias? as Catarinas?)
-os curandeiros? Irinéu, o doutor?
-seo Furquim, o homem que lia as mãos?
-ou seriam as benzedeiras “má inclinadas”
                       as feiticeiras de tudo?

Quem contará
             Campo Largo?

-as invernadas do gado
                        que Curitiba comeu?
-os ciganos dos escambos?
-os jogos de bola em nó de pinho?
-as pegadinhas,valsinhas,tangos
  e quadrilhas
ou os versos da “ratoeira” cantada
para traçar as donzelas das famílias
                                            distintas?

Talvez a flor de cambuí
ou o pé de butiazeiro,onde dorme
o tesouro enterrado lá na  c
                                            u
                                              r
                                            v
                                          a
                                            da Contenda.
Talvez a música d’uma sanfoninha
de 8 baixos
ou de uma viola de 8 tensos
sobre o chão de poeira trotado
pelos tamancos do Fandango
                                     de São Gonçalo

Talvez a reza do seo Janguito
ou a menta da hortelã,
a casca da laranja queimada
correndo na garganta.

Pode que a pomada
da casca do pau de Andrade
cure as feridas não contadas.

Quem poderá contar?

Pode que os sismos dos ventos abertos
tenham a tudo posto no esquecimento.
       Quem contará na derradeira
                                    tentativa?
        Talvez um poema
       -halos de anil
        e mãos que hoje acendem sol
        na trama eterna e imensurável
                          de fecundar a terra.

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